Utilização de imagens de satélite para estimar o potencial de arrecadação do IPU (Imposto Predial Urbano)
RESUMO
Globalmente, as cidades contam com os impostos sobre a propriedade (entende-se Imposto Predial Urbano) como uma fonte de receitas chave para financiar os serviços e aumentar a sua competitividade a longo prazo, tornando-as inclusivas, seguras e sustentáveis, proporcionando serviços básicos e acesso equitativo a eles. Sendo que esta medida tem impacto com o estabelecido no 11º Objectivo de Desenvolvimento Sustentável (SDG – do inglês Sustainable Development Goals) – Cidades e Comunidades Sustentáveis.
Neste artigo explicamos de forma sucinta como imagens de satélite de alta resolução auxiliam na avaliação da integridade dos mapas fiscais, com base na estimativa das áreas construídas e número de habitações, a partir da extracção da altura e contorno/delineamento (building foot print) dos edifícios. A metodologia assentou em 3 fases, nomeadamente aquisição de imagens de alta resolução, pré-processamento e processamento das imagens (segmentação das imagens, classificação usando modelos de machinelearning (softwares que usa classificação supervisionada Support Vector Machine SVM) e por último refinar os resultados. Com o emprego desta tecnologia é possível aferir o potencial de arrecadação por zonas, comparando-o ao montante actual arrecadado, trazendo uma informação valiosa aos órgãos decisores sobre como estabelecer uma cobrança mais eficiente com base na georreferenciação das principais zonas, o que permitirá aumentar os valores arrecadados.
Palavras-chaves: Imagens de alta resolução, satélite, IPU, machineLearning, buildingfootprint, TECH-GEST.
INTRODUÇÃO
Segundo o Banco Mundial, nos países em desenvolvimento, os impostos sobre terras e propriedades ainda estão muito abaixocomparandocom os países desenvolvidos, mesmo em termos relativos. A complexidade técnica e a falta de alguns recursos tecnológicos são percebidas como principais barreiras para trazer mais propriedades para a base de receitas fiscais, pelo que, de acordo com a mesma publicação, menos de 50% das propriedades tributáveis estão na lista de impostos, ou porque os mapas para identificá-las estão incompletos de informação, ou o acesso a eles é fragmentado entre as unidades governamentais. Recentemente, o Banco Mundial levou a cabo, com sucesso, o projecto para utilização de imagens de satélite para revolucionar a criação de Mapas de Impostos e Arrecadação de Receitas Locais em Kigali (capital da República do Ruanda) onde ficou demonstrado como as imagens de sensoriamento remoto podem reduzir significativamente a custo de criação e actualização de registos fiscais, permitindo a geração automatizada do contorno dos edifícios(com base nas alturas dos edifícios) e estimativa da área total construída.
A extracção e o delineamento automáticos de edifícios/casas (buidingfootprint) a partir de imagens de satélite de alta resolução actualizadas, constitui-se com uma tecnologia muito útil para esta aplicação, mas muito desafiadora, devido à grande diversidade de tipo de construções no país, o que torna difícil distinguir edifícios de outros objectos e delinear seus contornos. Neste sentido, houve um grande número de tentativas para desenvolver algoritmos de machinelearning para extracção semiautomática e automática dos edifícios. Alguns algoritmos para detecção com base em imagens de satélite de alta resolução utilizam critérios específicos de aparência do edifício, modelos digitais de superfície (DSMs) com informações de altura, forma e outros tipos de características para a sua classificação e extracção. Contudo, para países como Angola onde não existe um padrão definido de construções, há uma redução significativamente na precisão destes algoritmos.
OBJECTIVOS
- Explicar sobre as imagens de alta resolução para este tipo de aplicação e sobre como obtê-las;
- Explicar a metodologia para gerar mapas com footprint;
- Apresentar a ferramenta TECH-GEST em desenvolvimento no GGPEN que permite estimar o potencial de arrecadação do IPU, aplicável para todo o país.
FASE 1 – Imagens de alta resolução actualizadas
O emprego de imagens de satélite óptico de alta resolução espacial e actualizadas ou fotografias aéreas tem ganhando espaço como uma das fontes de informação no processo para gerar mapas de cadastro com delineamento dos edifícios. A resolução espacial refere-se ao tamanho de um pixel no solo. Um pixel é o menor ‘ponto’ que compõe uma imagem e basicamente determina o quão detalhada é uma imagem. A melhor resolução actualmente é de 30 cm fornecida por satélites comerciais de altíssima resolução, sendo uma das principais referencia a constelação (4 satélites) Pléiades Neo da Airbus com 30 cm de resolução e a alta precisão de Geo localização, podendo fornecer imagens mono, stereo e tri-stereo.
O Gabinete de Gestão do Programa Espacial Nacional (GGPEN) tem actualmente no seu portefólio de serviços e produtos a comercialização de imagens de alta resolução, resultado de parcerias estratégicas estabelecidas ao longo dos últimos 5 anos.
No que concerne a extracção e o delineamento automáticos de edifícios/casas a partir de imagens de satélite de alta resolução, quanto maior a resolução mais preciso será o resultado final da extracção.
FASE 2 – Pré-processamento e processamento das imagens
A extracção e digitalização de edifícios/casas a partir de imagens de satélite podem ser feitas usando o método manual, automático ou semiautomático. O método manual, principalmente para áreas vastas tais como as nossas cidades, se torna num processo demorado e tedioso, e apesar de garantir 100% de precisão, não são recomendados. Por sua vez, o método de extracção automático é bastante complexo e até ao momento não oferece 100% de precisão, devido a factores como a complexidade e variedade da forma dos edifícios/casas, cor e composição das coberturas, etc..
Neste sentido, o método de semiautomático permite uma economia de tempo na extracção destes elementos, devendo a mesma ser complementada com informações adicionais de várias áreas (dados das redes de distribuição de energia, água, etc.) e adaptação dos parâmetros de segmentação para a realidade local.
- Segmentação
A segmentação é definida como o delineamento de toda a imagem digital em diversos segmentos ou conjunto de pixeis. Os métodos de segmentação de imagem geralmente são usados para reconhecer e diferenciar várias características da imagem. Processo de segmentação de imagem divide pixels de propriedades semelhantes como reflectância espectral, textura, densidade ou área etc. em um grupo ou região.
O método semiautomático de segmentação foi usado o algoritmo MRS(do inglês MultiresolutionSegmentation) da ferramenta eCognition. Alguns desafios se apresentam na utilização deste método, nomeadamente a formação de conjuntos de regras adequados para extracção de edifícios, em virtude de existirem outros objectos com propriedades espectrais semelhantes aos edifícios, o que afecta a precisãona extracção apenas dos edifícios. As propriedades espaciais e espectrais são também dois factores importantes para a extracção. O método semiautomático envolve segmentação de imagem com base em factores especificados pelo usuário e classificação da imagem segmentada para extrair os objectos que representam os edifícios.
- Área de estudo
A área de estudo, definida no âmbito do projecto-piloto para estimar o potencial de arrecadação do IPU (TECH-GEST: IPU) esta localizada no Distrito do Kifica, município do Talatona, província de Luanda. A imagem multiespectral do satélite Pléiades de 2021 foi usada como input para análise e extracção dos edifícios/casas, tem a resolução espacial de 0,5 m.
- Metodologia
A primeira etapa do processo envolveu obter imagens de alta resolução. A segunda etapa de análise consiste na segmentação da imagem para obter os diferentes objectos na imagem. O módulo/software de segmentação e Cognition 9.0 foi utilizado com base no algoritmo de multi resolução. Após a segmentação, seguiu-se a selecção de amostras de edifícios/casas (sample selection) que é usada pelo software para aprender (machinelearning) pelo método de classificação supervisionada Support Vector Machine SVM.
RESULTADOS PRELIMINARES OBTIDOS
Seguindo com as melhores práticas neste sector o GGPEN, no âmbito do desenvolvimento de aplicações espaciais que visam resolver problemas reais do país, deu início ao estudo e aplicação prática de um modelo para extracção automática de edifícios/casas usando modelos de machinelearning. Os resultados obtidos, no que concerne a precisão do modelo, serão melhorados de modo manual e com a integração de outras fontes de para melhorar a precisão e robustez da extracção de resultados.
CONCLUSÃO
A informação quantitativa e qualitativa sobre o uso do solo e edificações é importante para o planeamento espacial e processos de decisão para os gestores por via do seu elevado potencial na análise e monitorização de áreas urbanas.
Apresentamos um novo método para extracção de edifícios em áreas urbanas complexas usando modelos de machinelearning (semiautomático) a partir de imagens de satélite de alta resolução actualizadas, que tem um grande potencial para fornecer uma solução robusta para o problema para estimar o potencial de arrecadação do IPU em grande escala.
O exemplo de Kigali ilustra a fiabilidade do método e o impacto a longo prazo nas receitas. As estimativas do Banco Mundial mostram que o aumento da base fiscal em 1%renderia um aumento de dez vezes na receita públicas.
Existem vários formas para obtermos mapas de cadastro das residências, frequentemente se opta por Sistema de Informação de Terras (SIT) desenvolvido como uma ferramenta GIS para mapas cadastrais, que consiste em um registo de terras preciso, actual e confiável detalhando seus atributos associados e dados geo espaciais (contornos do edifício). Deste modo o TECH-GEST apresenta-se como uma opção viável como fonte de dados cadastrais de alta qualidade.
Autor
Elcano E. dos Santos Gaspar
Licenciado em Tecnologias Militares e Aeronáutica, pela Academia da Forca Aérea Portuguesa, e licenciado em Engenharia Mecânica pelo Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL)
Especialista de Análise de Subsistemas de Satélites do Centro de Controlo e Missão de Satélites (MCC)