Desenho de uma missão de satélite

Antes de falarmos sobre o desenho de uma missão de satélite é importante entendermos porquê o homem teve a necessidade de estudar o espaço, ir ao espaço, pôr em órbita os satélites, e o porquê do investimento tecnológico tão amplo em tecnologias espaciais. Entendermos as vantagens que proporcionam estas mesmas tecnologias espaciais fazem com que, alguns benefícios sejam parafraseados:

         – O acesso a uma perspectiva global, isto é, nós podemos ver grandes áreas da superfície da terra, assim como providenciar cobertura de sinal em grandes áreas.

         – Uso de tecnologias sofisticadas fazendo com que seja uma das áreas da ciência mais desenvolvidas, com tecnologias de fabrico de ponta.

         – A rentabilidade dos produtos e serviços prestados pelos satélites, fizeram com que um nicho económico se deslumbrasse, garantindo uma vasta empregabilidade de até mais de 1 milhão de empregados em todo mundo, rendendo cerca de 423.8 Bilhões de dólares em todos os sectores da indústria espacial no mundo inteiro, de acordo com o relatório publicado pela Space Foundation no IIº trimestre de 2020. [1][2]

Entendendo o porquê da missão de satélite 

Tudo parte da necessidade para se satisfazer uma determinada demanda, por exemplo, interligar uma grande área territorial através da comunicação via satélite, ou monitorar a pesca ilegal ao longo da nossa costa atlântica, ou ainda, monitorar o fluxo comercial ao longo dos portos atlânticos. Questões como: que tipo de satélite será necessário para prestar esses serviços específicos (por exemplo: serviço de internet, TV via satélite, monitorar os oceanos com satélites de observação da terra, climatologia, navegação), em que frequências e posição orbital vai funcionar o satélite? Ou em que órbita estará alocado o satélite?

As respostas à estas perguntas, consistirá na elaboração de um plano de gestão contendo as actividades, fases e todos os eventos para avaliar o estado do desenho, o tipo de satélite que será construído (de telecomunicações, de observação da terra ou de navegação) e a consequente construção do mesmo. Cada fase é detalhadamente descrita em documentos, denominados requerimentos, contendo todos os objectivos da missão (especificações técnicas e os serviços que o satélite vai providenciar ou seja, respondendo o porquê da missão), os constrangimentos (avaliação dos riscos, possível implementação tecnológica e os custos totais) e as fases para o sucesso da missão do satélite.[3]

Arquitectura da missão de satélite 

O conceito, desenho, construção, lançamento, operação e o processo de desorbitar o satélite, são completamente descritos pelos grandes participantes internacionais da indústria de satélites: NASA [4], ROSCOSMOS [5] e ESA [6]. Desde a fase conceitual e desenho onde os requerimentos são os pilares dominantes, para a definição dos elementos da missão (Satélite, lançador, Centro de Controlo e Missão, estação terrestre), existe um conjunto de actividades e eventos, que variam de acordo com os padrões dos fabricantes ou dos encomendadores. As fases: Revisão do Conceito da Missão (MCR do inglês Mission Concept Review), Revisão do Estado de Qualificação dos Equipamentos (EQSR do inglês Equipement Qualification Stats Review), Revisão dos Requerimentos dos Sistemas (do inglês – SRR System Requirement Review), Revisão do Desenho Preliminar (do inglês PDR – Preliminar Design Review) , e Revisão Crítica do Desenho (do inglês, CDR- Critical Design Review), preparam os especialistas para a construção do satélite. Revisão de pré-embarque (PSR do inglês – Pre-Shipment Reviews), Revisão de Prontidão do Satélite (SRR do inglês, Satellite Readiness Review) e a Revisão de aceitação do satélite (do inglês SAR – Satellite Acceptance Review), preparam o satélite para o lançamento. [3][7]

Descrição das fases

Após a formulação das necessidades, começa-se a desenhar o satélite de forma conceitual, definindo os equipamentos, os sistemas e as partes que constituirão o satélite isto é, plataforma (parte que dá suporte a carga útil) e carga útil (parte que executa o objectivo da missão). A fase seguinte é a EQSR onde todos os equipamentos que serão integrados no satélite devem ser qualificados, de acordo com uma tabela de qualificação (A, B, C, D) [8]. Nesta fase o conceito de herança é muito importante, uma vez que o histórico do equipamento é um dos elementos chave para o sucesso da missão (verificar se o equipamento já foi usado num outro satélite anteriormente). Um dos processos feitos no princípio, é a avaliação técnica feita para definir se os sistemas, subsistemas e as suas respectivas funcionalidades cumprem o desempenho especificado. Essas actividades são descritas no SSR. A medida que o desenho é feito, alguns equipamentos qualificados que pertencem às categorias A e B, não devem ser testados tecnicamente, enquanto que o equipamento categorizado como C ou D, o seu desempenho deve ser avaliado.[9] Após o desenho estar completo, tanto do seguimento espacial (satélite – plataforma e carga útil) tanto do seguimento terrestre (Centro de Controlo e Missão), é realizada a revisão crítica do desenho (CDR). Após esta revisão o satélite começa a ser construído e nada mais no desenho pode ser alterado. Após a integração e montagem do satélite é feita a revisão de pré-embarque (PSR) com o objectivo de satisfazer e averiguar se todas as especificações técnicas estão conforme a matriz de verificação de desempenho garantido que o satélite está a funcionar de acordo com os objectivos da missão.[9] Se não apresentar anomalias o satélite é levado para o local de lançamento e inserido no lançador para se fazer os testes de prontidão do satélite (SRR). As revisões de lançamento também são feitas nessa fase, para verificar se o satélite está pronto para ser lançado. O lançamento é uma das fases mais sensíveis, mas o homem corre os riscos e desafia a gravidade com a ascensão do lançador, inserindo em órbita o satélite. Após a inserção em órbita, são feitos os testes de aceitação do satélite, garantido que o satélite funciona bem, e pode prestar o serviço para o qual foi desenhado e construído, no tempo de vida útil em que foi projectado. Após esses testes é realizada então a entrega para os seus compradores, terminando com a revisão de aceitação do satélite.

O Sucesso da missão 

Para garantir o sucesso da missão, é necessário que os objectivos da missão sejam detalhadamente transformados em requerimentos [3]. E dos requerimentos começa – se a construir o satélite, por meio de técnicos altamente capacitados e especializados.

É importante mencionar que o fabricante e o comprador, formem uma equipa, de modo a combinar os esforços, cumprindo cada um com as suas responsabilidades, para a validação das fases do projecto de acordo com o cronograma estabelecido. No fim de cada fase, é realizado também o pagamento.

A missão considera – se um sucesso, quando o satélite cumpre o tempo de vida útil, ou quando cumpre o objectivo na qual o mesmo foi lançado. É importante mencionar que quando o satélite aproxima – se do final do tempo de vida útil, um novo satélite começa a ser produzido para o substituir.

O Estado Angolano, com o intuito de acrescentar as infraestruturas de comunicações no território nacional e apercebendo-se dos benefícios que a indústria espacial proporciona, criou um programa espacial nacional, aonde o fim último é o uso pacífico do espaço, contemplando a implementação de novas infraestruturas, transferência de conhecimento e capacitação de técnicos, contribuindo para a empregabilidade e a inclusão digital. Angola faz parte dos poucos países Africanos que detém infraestruturas terrestres, capazes de controlar e monitorar o satélite. O país cresce no domínio tecnológico, para atender os mercados nacionais e internacionais.

Referências

  1. https://en.wikipedia.org/wiki/Space_industry
  2. https://www.spacefoundation.org/2020/07/30/global-space-economy-grows-in-2019-to-423-8-billion-the-space-report-2020-q2-analysis-shows/
  3. Space Mission Analysis and Design: 3rd Edition” by James R. Wertz and Wiley Larson.
  4. https://www.nasa.gov/
  5. http://en.roscosmos.ru/
  6. https://www.esa.int/
  7. Understanding Space: An introduction to Astrounautics: 2nd Edition by Jerry Jon Sellers, William J. Astore.
  8. Padrão ECSS-E-ST-10-03C.
  9. Padrão ECSS-E-ST-10-02C-Verification

Autor

Hugo do Nascimento

Mestre em serviços e Aplicações espaciais, pelo Instituto ISAE-SUPAERO, França

Mestre em Sistemas de Telecomunicações e Multicanais, pela universidade RSREU, Rússia